Este pêlo branco

Aqui, nesta montanha batem os primeiros matinais raios de sol e quando este desce e se apresenta o luar tem-se a sensação de que nada se apresentou diferente do que já foi, do que é ou que poderá vir a ser. Não espere nada, nem deslumbramento nem desilusão, não é essa a brancura que se pretende.
Anseie o nulo para que atinja o supremo início do tudo de novo.
Muito gosto,
Cabra Branca.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

GrisalhA

Chegou um fim
Corro para outro lugar.
Aqui o sol desceu à terra,
enfiando-se na ténue nuvem de pó.
Aqui me apaixonei,
sorri,
chorei.
Aqui ela e ele se foram.
Não há mais paz, nem guerra mais haverá.
Não sei bem como vou,
a correr,
a saltar, 
vou afinal, devagar.
Vou sem fazer queixas à mãe dela ou ao pai dele.
Vou quase a correr,
não sabendo se me levo. 
Vou,
inquieta,
não sozinha, continuarás comigo! Neste amor, por mais um único qualquer dia, até que fiquemos velhos e grisalhos.
Aqui mais nada tenho a dizer,
nada mais há a fazer.
Deixo os cascos,
calço uns sapatos,
...de salto alto
e vou,
corre!
 

chego a um FIM,
até lá, no outro lugar.
Quem desejar seguir-me, manifeste sua vontade para a próxima corrida: 
cabrabranca@gmail.com
será assim enviado o link ( com brevidade) do novo blog.
Obrigada a todos(as) os que me seguiram ao longo destes maravilhosos anos.

Bianca, a Cabra que foi branca.

terça-feira, 2 de julho de 2013

Domésticas


Pois pertenço a quem deseje, assim sobre um domínio de inventor a uma imagem de meu ser. Sou quem sabe Dela, caibo a um Ele e talvez ajuste a um Tu. Sirva mesmo assim a Ti, que estás feita leitora e és um Você. Sim, um simples você...

Não te conheço nem te apreço, seja de frente ou de lado, nesse perfil acostumado. Não! Não te avalio ou reconheço, não te admiro muito menos te penso. Também não te conto um único ponto ou te encanto com um fado. Repara, que isto não é recado! E pergunto-me; - E  que vens aqui fazer?

Dá-te a um simples escutar, um bater de teclado, numa máquina de escrever que não é alguidar remexido, espumado por um pó de lavar.
Lê, ainda que excitada, que não sou ingresso para uma vida pouco amada ou bebida que te deixe embriagada, desassossegada ao adormecer. Aqui, não encontrarás nada. Razão, conforto ou solução, nada! Não te dou a mão. Mas, tu perguntas; - E que vieste tu fazer?

É justa essa tua interrogação! Será meiga a minha posição?
 
Será, serei mais que um assobio, um olá, um aceno, um até já. Será, um não crer quem sou, um fim sem engendrado começo. Não te melindres, não invado, não invento, não destruo o que construíste. Quero só que acredites, que não sou formula criada nem ampola ajustada a uma terapia renovada. Serei, um todo alterado, adaptada à imagem inteira de quem me tem como querer ser. Sou uma Dona como tu, pouco domestica e com leve dose selvática. E eu cuidarei Dele...
Porque me quer? Não sei! Nem me afiguro em tão esbelto pensar, nem nesse teu (in)prazer de me conheceres. 

a ti,
que és uma Ela, um Você, és também Dona e a outra mulher.

domingo, 30 de junho de 2013

terça-feira, 25 de junho de 2013

Pisar


Envolta em amargura saiu para a rua. Admitia-se sem enchimento.
Não transbordava qualquer tipo de sentimento, nem dor, nem admiração, sofrimento ou imensidão. Consentia fel, num pisava de calçada usada, que até achou muito para si. Ansiou um carreiro de pó terra ou uma areia fina e húmida em carícia pelos pés. Entristeceu, era cidade, o que se tinha como simples caminhar, era aquela calçada coçada.
Aceitava-se como uma bica pouco escura, pouco quente e bastante amarga, que num trago a engoliria sem protesto ou registo num livro de reclamação. Que haveria por insurgir? Como um bolo sem direito a recheio, um pastel sem camarão, umas pipocas sem açúcar ou sal, a quem assiste um filme que não é seu. Convencia-se sem persuasão de que jamais seria o dela. Uma fita crua, que não satisfazia os mais ínfimos desejos queridos, não enquadrava e muito menos  abrangeria um pouco do melhor de todos.
Voltou a casa, julgando-se suada por um suor sem odor, sem mancha amarelada, não emanava satisfação, alegria ou tristeza. Teria coração? Batia-lhe sim, sem grande convicção.
Sentou-se sobre uma caixa vazia, olhou sem emoção pelos  dois minutos em falta para um fim. O programa da máquina da roupa suja parou, suou o som, leu-se FIM.
 

quarta-feira, 19 de junho de 2013



A minha vida está estranha. A verdade é que tive de a conhecer. Agora, a minha vida está tão estranha. Conto-vos, apaixonei-me por Ela, não pela vida, mas por Ela, a que conheci. Aproximei-me e apaixonei-me por Ela, quando pela primeira vez a vi. Estranho, como a minha vida se tornou demasiado estranha desde daí. Ainda mais a amei quando a consegui. E agora o que torna a minha vida atual tão estranha é não a ter. A minha estória é sem história afinal, sem princípio meio ou fim, como todas as outras histórias. Ainda assim, a estória que é Ela, se desenrola no que sou, nesta estranha pessoa que fez de mim. Estranho, esta pouca vida em mim. Ela é, Ela é, Ela é o reflexo que reflicto sobre esta coisa estranha dentro de mim, Ela, que lhe digo que é vida. A minha vida. Estranho. Será uma sombra? Uma pintura que não foi pintada ou um semblante de tudo o que nunca começou, não se viveu meio e nunca se sentiu um fim. A minha vida é tão generosamente estranha. Estranho...



domingo, 16 de junho de 2013

Brainstorm



Como era bom perder-me, desaparecer dentro de ti, como quem larga a mão de um alguém depois de um profundo respirar e entrou. Entrou nesse teu avesso, onde só se escuta o teu respirar e se vê essa tua forma que é de verdade amar. No teu olhar nada vi, agora, aqui dentro de ti, nesta sombra de teus fígados, nada é obscuro e debaixo do teu coração melódico o ritmo é outro, é de um chegar distante é  de um partir longínquo. E da parte de dentro dos vidros do teu olhar, nem imaginas o colorido que há, do que não está aí, desse lado de lá. Estranho por ti, porque tu nunca soubeste que tipo de noite te habita, se das escuras ou das luminosas por um luar. Colora esse teu olhar e escuta, não desapareças feito louco sem respirar!  A luz desconhecida aproximar-se-à e as tuas mãos enrolarão num sorriso que virá de dentro, daqui deste teu oposto. E essa angustia desaparecerá e que bom corar...


Acho estranho porque tu nunca soubeste.


quinta-feira, 13 de junho de 2013

seTENTA






00:39, marcava como um contador de divida, no relógio em repouso sobre a pilha de revistas que fazia de cabeceira naquele quarto interior. Era noite de Santo António, o casamenteiro. Lembrou-se que se esquecera no entretanto da vida de se casar. Elevou a cabeça 4 cm da almofada e com algum esforço esticou o braço ao meio copo com água perecido  na extremidade encaracolada da revista Vogue já com alguns anos de modas prescritas. Deu-lhe para a tosse no percurso da palha à boca e julgou que em lugar de matar a sede a sede da morte a sugaria primeiro através daquela palha parda e fétida em saliva por várias noites usada. “Calma”, retorqui, usando a expressão do louco, seu vizinho do lado, mais novo que ela cinco anos, mas bem mais emplastrado. Ainda assim, sentiu-se feliz, por sabê-lo a dormir do outro lado da parede e por a pílula do sono lhe ter feito efeito. Já não o ouvia, nem às ruidosas e porcas flatulências, as que ele sabia que a levava aos nervos acabando com os já poucos fios de cabelos brancos que lhe restavam colados ao couro, os outros, faleciam amontoados sobre o travesseiro de fronha amarelada. Pensou em chutar-se em mais meia dúzia de valerianas, mas achou por bem gozar mais uns minutos de vida. Respirou fundo e tragou dois valentes goles na palha, sentiu o líquido morno e contaminado, quase com embriões, pela garganta. Sorriu no pensar, "ainda fico grávida!" Riu e com o mesmo sorriso entrou naquele azul.

Achou que descera à terra poucos segundos depois de ter dado entrada nos céus, nunca o imaginou, ainda assim, tão burocrático. Mas teve alta para visitar o vale dos pouco vivos ao fim de tempo para si já impreciso. Não descansava em solo paradisíaco sem antes vislumbrar sua lápide terrena.
Confirmara com agrado que o cabrão do vizinho dera seguimento ao prometido e nela teve o prazer de ler:

"tenho-te no coração desde setembro de 2012, descansa em paz nesse agora tão nosso AZUL"
1972- 2042

   

quarta-feira, 29 de maio de 2013

domingo, 26 de maio de 2013

Até ao limpar do pó


Adoro estar contigo, sem alíneas, pontos, ordens de importância e sem faceta literária. 
Adoro estar contigo em casa, na sala, no quarto, na cozinha, na casa de banho, no corredor, nas escadas, no simples andar na rua, no carro e até na mercearia. Adoro estar contigo, porque és sexy e fazes-me sentir sexy. Quando viajo e enrolo-me no teu corpo, em todo ele e toco-te, cheiro-te  e desejo-te lamber.
 
Adoro estar contigo a comer, a dobrar roupa e até limpar o pó, e o que detestamos limpar o pó, nunca o fizemos juntos, mas contigo não será desagradável. Adoro estar contigo a falar, a rir, a trocar estórias e a aprender escutando-te a ler. 
Adoro estar contigo, pela tua sensibilidade, criatividade e inteligência que me estimula e me faz querer ser melhor, sendo eu próprio. Adoro estar contigo, fazes-me afortunado, marcas a diferença dos pequenos momentos, tornando-os autênticos orgasmos mentais.

Já te disse que adoro estar contigo?...já?...não faz mal, nunca é demais dizer o quanto se 
adora estar contigo. 

sábado, 18 de maio de 2013

gozo de te foder



















Qualquer palavra para ti agasta, qualquer amo basta.

Amo-te por me foderes, por me teres a jeito, enfiares-me a preceito. Amo-te nessa posição de deleito. E então fode-me, fode-me com efeito, roda-me tu sujeito e ama-me, vomita-me, sacrifica-me,  pelo que te trago no peito. Escuta-o quando tens esse ouvido colado ao despeito, depois digo-te o quanto te respeito, o quanto grito sobre esse amor que parece quase perfeito. E mesmo que não me largues ou mesmo que me deites, diz-me, fala-me desse gozo que me agasta e arrasta naquela palavra já tão gasta. amo-te! 

* a todos os anónimos portadores de qualquer nome.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Qualquer coisa




Sete e cinco. Acordou em sobressalto ao som da porta do prédio. Saía para o trabalho a Sra. Qualquer coisa, que, religiosamente abalava para mais de 20 anos à mesma hora. Hoje saíra com 5 minutos de atraso.
Sete e cinco. Sentiu-o a seu lado, suado pela manta pesada que os cobria. Sobre a nudez dele, escorriam seus alegres pêlos junto ao peito. Ele estava feliz, apesar do abafo, o sorriso tatuado no rosto sereno denunciava o quanto não queria saber de calores. Estava afinal, onde nunca devia ter saido.
Sete e cinco. Só a sensação dela, afinal não passava de um prolongamento de um sonho matinal e já bem ao de leve, ali só estava um único corpo e a lembrança do cheiro a Denim dos anos noventa, que a fez esboçar um sorriso por cima da dor que sentia.
Levantou-se com a mão sobre o pescoço, doía-lhe mais do que gostaria. Abriu a bolsa das drogas e antes de qualquer outro alivio, encheu um copo com água e engoliu em esforço a pílula alaranjada. Hoje só o poderia mastigar, engolir seria imprudente  naquele estado doente.
No entanto atreveu-se a pensa-lo a dormir. Como estaria a dormir? Suado? não pela manta de lãs coloridas, mas quem sabe por um sonho fermentado a desejo? Mastigou esse pensar, travou um gole no café forte da manhã e pelo cheiro aromático pensou como o tragar.
Olhando pela janela que dava para as traseiras, falou alto, inteira e integra como sempre. “- Trago-te como que dentro de uma caixa de costura, em que as linhas se enrolam unidas num novelo de finas linhas coloridas, emaranhadas confusas e chatas! Na confusão alegre de cores, moram as traiçoeiras agulhas perdidas, prontas a espetar, piores que farpas de uma madeira antiga, robusta e maciça no meu sentimento fragilizado!”
Arrancou da dormência de o ter junto a si, sem esse existir de facto, nem sabendo ao certo se estaria ali mais do que um sentimento do pensar vir a ter um outro igual, num outro qualquer dia.
Sete e trinta e cinco. Saíu atrasada...


   

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

voz











A tua voz... lembra-me tudo o que és que eu não conheço, já tem um fim sem começo. Desejo deitar-te neste colchão, és um alguém que aquece a quem aqui está e te desconhece, mas espera delirante um tal belo amante. Todos sabem, sem medo, os que já foram, embora a nenhum lhes chegou um fim. Tu podes ser o meu império, promessa séria, entre quem te leva a este chão, sem magoar, uma e outra vez, mil vezes sem ilusão, quero ouvir essa voz, guarda-la em mim e perde-la tantas vezes e depois sempre a encontrar.
Pega em mim, eu não quero saber, eu não quero saber que estranho és. E sempre que venhas amante, tira-me, leva-me daqui e recorda que já vieste tantas outras vezes e viajaste quilómetros dentro do que sou. Se um dia tiver fim, não existe quem não se conhece, és alguém que volta sem nunca ter chegado a vir ou mesmo a partir.
Podes ser tudo, sem desculpas, altos ou baixos, não quero saber, só quero uma luz que não se apague, só quero mesmo cair neste colchão, percorrer um milhão... de mim.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Mente com todo o pecado,

porque não passas de um pecador.


Mente. Acredita num dizer que em nada se assemelha a sombrio, nem esse abraço em nada vago ou que bafa a mofado por um tempo que não existiu. Mente-me. Esquece o amanhã, o agora abona, quer brilhar como um sol bichanando uma só palavra aldrabona. Mente-lhe. Diz-te de um amor cego, que talvez seja pesado, diz-lhe sem medos o que queres, agarra e mente, vagueia crente nessa tua mente que ludibria um bocado. Mente-te. A noite vai alta, tão alta que se pode cair, arrisca em pecado, não tarda dirás adeus. Mente-lhes. Agora beija-as, dizendo-lhes que não vais nesse escuro, pelo menos não nessa noite e estarás ao amanhecer, não serás uma palavra solteira que mente no olhar. Mentiu. Salvou o momento esquecendo o ontem, esse é o som do movimento lá fora que fez tombar a chuva da trovoada, naquela cama dedilhou de prazer em forma escabrosa de quem disse, “minto pelo esquecer do amanhã”. Minto-me.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

vontade efémera


o que fora o passado poucas razões deixara para lhe motivar o presente, certo era que o sentido perdera-se. Aguardou por ele como sendo um amor de futuro, privou-se de outros amores, passou a desconhecer a própria palavra – amor – e um dia ele chegou. Vinha carregado de mentiras, pois não tinha como mostrar a verdade, nem como enterrar o passado. E veio ele, disfarçado em posturas, igualado a um presente só com caixa embrulhada. Lá dentro, recheava-se a vazio, por incertezas do que se andava a fazer. O amor.
Estavam ali acreditados disso, sentados no centro da sala, num requintado restaurante, duas secas criaturas. Repastaram surdos, engoliram mudos, afinal não se conheciam, já mais se viram. Ainda assim à mesma mesa comiam vidas vagas, passadas, jantavam mágoas, naquela elegante mesa. A toalha, imaculadamente branca, tal como o prato, os talheres cintilavam espelhando dois rostos consumidos por uma espera iludida e os copos brilhavam do lustre passado pelo pano macio, o que os livrara de qualquer impressão digital. Nada se sentia ou fazia sentido, nada aquecia, nem deixava rasto, muito menos nódoa. Oooh como uma nódoa faria toda a diferença sobre o prezado requinte. O cuidado a mais a não ser magoado, um argumento pouco sujo, pouco lavrado, muito menos rubricado, nem a gordura, nem a um só odor ou suave aroma a amor... falhou, não morava, nunca morou, para quê o ter esperado? Arrogância, altivez, quem sabe uma enorme estupidez!

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

O perfeito assassino


“então começamos com a carta do ano para o ano inteiro: a morte; a mudança, algo se renova porque algo vai "morrer". A morte, a carta mais forte de todas, vais dar início a um novo ciclo, 2013 vais começar de novo!”
estou a ler a tua morte e sinto-a tão minha, quando ainda não me dera ao desplante de a pensar só para mim. Mas agora preciso dela, quero-a. EU quero a morte, desejo-a, com maior egoísmo a espero. Paciente aguardo-a a ser celebrada pelo meu perfeito assassino.
Estranho este sentimento que inauguro ao ler-te, quase que te escuto a sussurra-la em voz branda junto ao meu pescoço. Contas-me o que a morte nos conta - a morte - quando afinal ela ainda está tão estranhamente viva, com um desgaste imenso nas entranhas mas que vive num corpo ligado a uma máquina, e essa não se quer desligar para deixar a morte morrer de vez.

Que me contas tu desse fascínio de morte? Que me faz quere-la por tudo o que seja nosso? Será uma arrogância que roça à minha altivez moribunda? Saberia-a assim confortável, a morte, a minha, parecesse tanto com a minha...  Leio, tenho um calafrio de dor, quem sabe pelo frio ao esmiuçá-la, estarei a chocar morte? A abrir lugar a uma ferida fingida a cicatrizada, onde o vírus entra sem esforço e sorve de dentro para fora como um shot rude batido no final na madeira do balcão de um bar agonizante?

E escorre-me um lágrima pelo gosto de saber de tua morte, da viveres, uma morte tão demoradamente doce, que grita prazer de a sentir como tal, como a quem do corpo só caíram os pedaços de carne um dia árduos amados, que esses bocados já não mais fazem falta. E o ranho mancha-me as mangas do casaco de andar por casa ao assistir os quilómetros percorridos da capela onde velavas até ao chão onde serias aquecido pela terra e um dia esquecido pelo tempo.

Invejo-te agora, sabendo que a tua morte já é ela tua serva, e que te cose as feridas do corpo a linha rosa e ainda as pincela a desinfectante de amor que um dia será o eterno, ela que te abria rasgos num estado de demência, ela queria se ver espelhada na luminosidade do teu sangue, das feridas angustiadas que eram suas frustrações, afinal ela é a morte.
Esclareço-me no teu estado, aquele que um dia foi de defunto e apaixono-me por ti.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013




Quis a tua nudez.
Não quis que te despisses.
David Mourão-Ferreira









Jean-Baptiste Mondino

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

azul


Nasci homem sem me aperceber que mulher seria ou terei nascido mulher? Escrevo do pouco do homem que sei e dalguma coisa de mulher que terei. Afinal, não serei nem homem nem mulher. O que escrevo, o que falo, é um acredito que acreditei, no homem que serás, na mulher que talvez serei. Tu que homem és, revela tudo o que quero saber, tudo sobre o que não saberás contar. Não será preciso, afinal como mulher digo, nem numa palavra acredito, e como homem trago em mim um macho aflito! Sei, mais fácil desventrar-te que revelar-te. Tu homem, de uma mulher saíste do escuro feminil, dum ventre sem limite. Mas te descortino, sem grande desatino e ri-te varão, lá sabes que razão, o porquê de teu tamanho, concederam-te envergadura, tal gótica arquitectura, doaram-te força e mestria, algum poder empacotado e sabedoria. E tu, sorri princesa, a ti sobrou beleza, suave brejeirice, uma forma sábia de sacanice. Eu? Já disse, nasci mulher sem me aperceber que homem seria ou terei nascido homem... que importa, escuta, bebo presunção, engulo em julgada permissão, até dou por desbarato este parecer ingrato, essa única costela de Adão que agora parece bem por ocasião. Serei fêmea em confusão? Nada disso, só quero uma razão, que há, diz másculo altivo, existe na mulher que sou e no homem que me mora, sim, sem mais demora, todo tu és macho flora, fêmea rendida, dignos de o ser, agora toma como tino, sorve esse comprimido, que tem cura. Acordamos agarrados, cegos sem sexo concedido, engole outro curativo e vejamos de repente tudo o que é diferente.